O meio BDSM Brasileiro tem suas particularidades e história própria, apesar dessa cultura não ser nativa do Brasil. O bdsm tem origem em países Europeus como Alemanha e Inglaterra, e concomitantemente EUA, ou seja o norte do globo foi onde essa cultura teve seu start e maior desenvolvimento.
Em idos dos anos 70/80 o bdsm aporta no Brasil e muitas pessoas que praticavam de forma tímida começam a querer reunir grupos, apesar que apenas nos anos 90 (quando realmente a internet começou forte em nosso país) que surgiram websites específicos, clubes e festas. Nesse ponto o Brasil demorou bastante para se desenvolver.
Neste período muita coisa aconteceu, praticantes surgiram, criaram fama e também se aposentara. Como tudo na vida evolui, o BDSM evoluiu também a cada nova geração, e aí que entramos no choque entre as gerações de praticantes, os Dinos e os News. Nesse artigo vou tentar explicar em detalhes as diferenças e porque existe tanta discordância.
OS CONCEITOS
Para podermos entender quem é o que e o que cada grupo significa, temos que compreender alguns conceitos básicos como Liturgia, Fetiche e Kinky (escrevi um artigo interessante sobre o que é Fetiche, Kinky e Fantasia Sexual aqui).
Liturgia
O vocábulo "Liturgia", em grego, formado pelas raízes leit- (de "laós", povo) e -urgía (trabalho, ofício) significa serviço ou trabalho público. Por extensão de sentido, passou a significar também, no mundo grego, o ofício religioso, na medida em que a religião no mundo antigo tinha um carácter eminentemente público.
Teoricamente a Liturgia BDSM inclui a Hierarquia, Rituais, Regras e uma "seriedade". Porque teoricamente? porque estes itens não são exclusivos de quem segue liturgias e nem BDSM.
O termo liturgia foi mal empregado dentro da prática BDSM no Brasil, pois fez parecer que se tratava de um ato religioso, mas no entanto o objetivo de Liturgia nesse caso se refere aos Rituais. Logo um ato litúrgico é um ato ritualístico. E todos nós temos nossos rituais, pois se trata de uma característica humana. O quanto você da importância para o seu ritual que vai evidentemente fazer a diferença.
O simples ritual diário ao acordar e iniciar o dia de trabalho é um Ritual, logo uma Liturgia diária. Uma palavra que veio a substituir a Liturgia dentro do BDSM é o Protocolo. Fora do Brasil se você buscar em inglês a palavra Liturgia BDSM, você não encontra absolutamente nenhuma informação. Só que ao ler os PROTOCOLS, você percebe que são as tão famosas liturgias.
Basicamente o que vivemos por anos aqui no Brasil foi fruto de uma tradução errada, empregada de maneira equivocada, mas essa situação está mudando.
Fetiche
Da mesma forma como a Liturgia, o fetiche em si não foi bem traduzido e interpretado. Algumas pessoas de forma reativa começaram a usar a palavra Fetiche não para ser uma expressão de suas vontades, mas sim uma forma de contraponto e ataque à Liturgia. Como se fosse a Liturgia uma espécie de Ordem e o Fetiche um tipo de Caos, nada mais longe da realidade.
Essas pessoas (não darei nomes mas eles sabem que fazem isso até hoje) resolveram criar uma politica de nós contra eles, e dividiram o BDSM. Esse período criou-se uma rixa que permanece até hoje entre os "Litúrgicos" e os "Fetichistas".
Dinos e Fetichistas
Certo, agora que você entendeu alguns pequenos conceitos do BDSM, tivemos uma cisão entre duas linhas de pensamento, vamos entender cada uma delas em detalhes para não restar dúvidas e poder seguir em frente.
Dinos
Os Dinos (que vem de Dinossauros) são aqueles praticantes mais velhos de BDSM no Brasil. Aqueles que praticavam nos anos 70/80 de forma velada (sim porque se você já estudou história do Brasil, ente os anos 60 a 80 estivemos em uma Ditadura Politico Militar, e reuniões desse tipo não eram lá muito bem vistas, podendo dar cadeia ou coisa pior) então os Dinos praticavam escondidos, mas isso não quer dizer que eram chatos ou pedantes, muitos não eram, estavam como você está agora, descobrindo seus prazeres.
É lógico que não podemos generalizar e dizer que todos os praticantes desse período agiam e pensavam igual, mas a maioria era reservado e tinha q ser. Pense que não existia rede social, nem internet, o mundo era muito menor, os Brasileiros não iam com frequência para a Europa e nossa moeda não era nem de longe forte como é hoje. Existem diversos tipos de pessoas no mundo, e infelizmente também temos pessoas arrogantes. Isso não quer dizer que todos os Dinos são assim.
Agora que você levemente conheceu a realidade dos "Dinos" pense que eles não deixam de serem humanos, como suas falhas e acertos, e com o tempo vão cansando de certas situações sociais e pegando manias. Todo mundo é assim. O que ocorre é que os "dinos" já fizeram inúmeras experiências, tentativas e erros, sabem o que funciona e o que não funciona, mas aí reside um problema Geracional. Poucos são os "dinos" que sabem ensinar o que aprenderam com didática, então o normal para eles é ensinar através de lições duras sem muita conversa, e isso afeta as novas gerações que são cada vez mais sensíveis às informações passadas.
Algo que difere muito também é que a maioria dos antigos praticantes não ligavam para roupas específicas de couro ou látex. A moda era outra, a realidade financeira do país era outra e os gostos eram outros. Alguns o praticantes antigos, viam essas roupas como gasto desnecessário ou era algo para se usar em privado. Tirando festas Gays e muito alternativas nos anos 90 não era comum o uso cotidiano de roupas fetichistas e muitos brasileiros nem tinham acesso.
A relação de um Dino com um New é como se seu avô quisesse te ensinar como namorar, mas o seu estilo de namoro por redes sociais, tinder e match que é diferente do dele na vida real, e aí existe o choque, só que sem sentimento porque vocês não são parentes, você só vai pensar: "Que velho chato".
Falsos Dinos
Vamos ser sinceros, no Brasil isso é comum até demais. O Falso Dino é uma pessoa que tem a idade física de um praticante veterano do BDSM, mas não tem a experiência real e prática destes veteranos. O que os Falsos Dinos tem é uma teoria sem fim, fruto de pesquisa na internet e usam do artifício da "Carteirada BDSM" (Quando um falso Dino chega em um novo praticante e exige respeito porque tem mais de 20 anos praticando BDSM), muitas vezes a pessoa tem zero experiência pratica e se faz parecer um Dino porque teoricamente seriam mais respeitados.
Essas falas geralmente caem por terra com poucas trocas de mensagem, é só você ficar atento aos sinais de um Dom real ou Dom Fake (já escrevi sobre isso, confira aqui).
Preciso deixar claro que a grande maioria das reclamações contra Litúrgicos vem dos Falsos Dinos. Eles tem uma falsa impressão que ao mentir conseguirão ter mais fama e êxito na pratica BDSM.
Fetichistas
Os fetichistas ainda são um grupo social dentro do BDSM que de forma reativa, criam falas contra os Litúrgicos. Algumas vezes eles se denominam como Anti-Litúrgicos como revolucionários, modernos, e em geral jovens de idade.
O foco de um fetichista social é o uso de roupas diferentes, chamativas, eróticas e provocantes. Existe uma infinidade de fetiches que não são ligados à roupas, mas o uso delas meio que molda esse grupo social. Como disse acima não era algo necessário para os dinos o uso desse tipo de roupa, então alguns deles acham (de forma totalmente errada) uma infantilidade ou besteira o uso de roupas de couro ou látex, porque na mente torta de alguns deles isso não faz um praticante de BDSM, e realmente a roupa não faz uma domme ou dom, e nem o chicote, é a atitude que conta.
Esses Anti-Litúrgicos Fetichistas são pessoas que por algum motivo repudiam os rituais, a hierarquia e a "seriedade" achando que criando o Caos Revolucionário irão criar comoção na sociedade, chegando ao cúmulo de ligar ideologias político partidárias
à palavra fetiche, como se você só pudesse ser fetichista (e praticar BDSM) se você é jovem, bonito, usar roupas fetichistas e pensa fora do sistema. E nessas obviamente os representantes mais velhos "Dinos" são o alvo perfeito, pois são o contraponto extremo.
Kinksters
Os kinksters (sim eu me considero Kinkster) são pessoas que conseguem viver as duas realidades e nenhuma delas ao mesmo tempo. Conseguem ser Fetichistas sem deixar de ser praticantes de BDSM e praticam bdsm muitas vezes de forma ritualística com elementos do Fetichismo, e tudo bem porque é algo particular e não uma prova social.
A roupa fetichista, os acessórios, bons equipamentos e boa qualidade educacional são o que define um kinkster, além de conseguir transitar entre uma Liturgia e um fetichismo de forma livre.
Kinky não tem uma tradução específica em português, mas é algo entre ser pervertido, fora do padrão, com uma mentalidade diferenciada. De certos todos os praticantes de BDSM e todos os fetichistas são Kinksters. A unica diferença, se é que ela existe, é que um Kinkster tem a conciencia que brigar pelos seus prazeres é uma coisa incrivelmente idiota.
Dinos Vs New BDSM
Pronto, agora que você entendeu uns detalhes de quem é quem nessa bagunçado BDSM brasileiro, consigo te explicar meu papel nessa treta.
Quando eu iniciei os meus estudos sobre o BDSM, a comunidade da época era extremamente fechada (leia acima porque) e eles não faziam lá muita questão de jovens virem a aprender, ainda mais um rapaz de 18/19 anos. Nunca fui proibido de fato, mas era difícil. não existiam outras pessoas da minha faixa etária, não tinham submissas jovens, a média de idade era 30 / 40 anos. Pessoas com mais estrutura social e psicológica para vivenciar a pratica erótica do BDSM. Mas eu insisti, tomei gosto e aprendi muito mesmo com os Dinos.
A parte chata é que alguns desses dinos sempre foram "Caga Regras" (basicamente o tipo de pessoa que impões sua regra pessoal como se fosse uma regra do grupo social e julga quem está certo ou errado), e justamente essa atitude Caga Regra que fez surgir a reação de Fetichistas e Anti-Litúrgicos. E sim tem um monte de Fetichista e Anti-Litúrgico que cagam as próprias regras, só que só sabem atacar e não reconhecer que fazem igual à quem criticam.
Vamos deixar claro que "Cagar Regra" não é explicar como é a pratica BDSM, o que é o que, as diferentes opiniões.
"Cagar Regra BDSM" é impor suas opiniões particulares sobre o BDSM, como se fossem Regras Absolutas e Pétreas.
Então você tem "Caga Regras BDSM" sejam mais velhos ou mais novos se digladiando para ver quem está mais certo, ignorando o prazer dos outros e une-se ao caos os Falsos Dinos e Anti-litúgicos politizados. Óbvio que você iniciante pensa: Para que vou me enfiar nessa bagunça? Só que adivinham, se você está lendo isso é porque você já está na bagunça, só não sabe o que fazer para sair dela. Calma que vou dar o caminho.
Por um tempo, eu influenciado pelos "Caga Regras", fui um caga regras chato pra caramba. Dono da verdade, arrogante e com um ego inflado que batia na Extrato esfera (sim é uma autocritica, isso se faz necessário), não que eu tenha virado santo e alcançados a Iluminação, longe disso mas consegui ver do lado de fora da treta. Quando eu tive uma oportunidade de viajar para fora do Brasil à turismo (Hamburgo, 2014), em um evento internacional de Fetiche e BDSM, eu tive um choque cultural que me fez repensar. Lá estavam praticantes de BDSM que usavam roupas de fetiche (ha tá bom hoje muita gente já viveu o mesmo, mas foi a minha experiência), me deu aquele estalo de que eu estava fazendo de forma errada. Quando voltei ao Brasil, eu fiquei chateado porque sabia que aqui ninguém ia entender aquilo. Hoje as coisas estão mudando.
Outra atitude muito chata que ocorre direto é um "Caga Regra" BDSM tentar diminuir uma pessoa o chamando de Fetichista, como se uma pessoa fetichista fosse menos que um BDSM. Isso é uma atitude que ajuda na separação das pessoas, continua com a política do nós contra eles, e não leva a lugar nenhum.
Atualmente tenho uma idade física onde estou no meio do caminho entre os Dinos e os News, retive experiências de vida BDSM de um Dino, mas mantenho contato com os iniciantes e novatos (os news), além de ter tido aquela experiência fora do círculo viciado brasileiro.
Cheguei à conclusão que eu já fui um New reativo que peitava todo mundo e queria mostrar o quanto os mais velhos estavam errados, só q hoje a experiência de vida me fez ver que alguns ensinamentos estavam certos e outros não. Não vou dizer que meu exemplo é a solução, mas se você conseguir observar fora da situação, tentar sair do embate principal, pode ser que perceba a banalidade que é dividir o BDSM entre Dinos e News.
Os Dinos devem ser respeitados pelas sua experiências mas de forma alguma divinizados como se fosse impossível deles errarem. E não os News não são os revolucionários salvadores da pátria bdsm. Todos eles tem que entender que BDSM e Fetiche se trata de prazer e não uma forma de se sobressair em cima do outro.
Se quiser mais dicas e mentoria para melhorar seu BDSM, entre em contato, será um prazer te ajudar noa sua jornada.
adorei, obrigada por compartilhar. jemma sub